cartas para plutão
antigas

para uma flor murcha
para melhores amigas
para um doutor



cannothelp@gmail.com

Você faz coisas que me machucam, mas acho que nem percebe. E eu costumo não saber o que fazer, porque eu não sei se eu deveria te mostrar que me machucou, pra ver se da próxima vez isso não acontece, ou não falar nada - se a gente fingir que não aconteceu, a coisa não desacontece?

Também não sei o que me machuca mais: o que você fez que me machucou ou o fato de você não perceber que saiu sangue aqui.

E eu faço o quê, então?

A maioria é ferida antiga, é coisa pequena e boba, mas que acumula e acumula e dói quando uma nova surge. Dói porque as outras não fecharam direito, você não me ofereceu mercúrio, você não perguntou se tinha melhorado - você nem viu que eu caí.

E eu caio.

Eu não te conto isso, porque agora eu sou grande já, eu não deveria cair, eu deveria agüentar tudo, ficar de pé sempre, levantar sozinha de manhã e conseguir sorrir, fazer meu café sozinha, olhar a paisagem e ficar feliz. Eu não deveria cair, não deveria deixar que coisas tão poucas me machucassem, mas machucam. E doem, viu. Dor física, às vezes, de ter aperto no coração e ficar enjoada e tomar remédio para melhorar. Eu não gosto de tomar remédio, eu não gosto de sentir isso, me sinto boba e injusta.

Acho que isso é porque hoje é dia das crianças e eu gostava de ser criança, de cair sempre no mesmo lugar da ladeira, de cultivar cicatrizes nos joelhos e de receber cuidados. Acho que me deu saudade de ter mão me ajudando a levantar.

Mas eu levanto. Hoje, amanhã ou depois. E sozinha, prometo.

Tua culpa,
F.